segunda-feira, 11 de junho de 2012

Carta a Nietzsche


Mais do que ninguém, entendo a sua dor e  o seu jeito todo peculiar de afrontar o sofrimento.
Lastimo apenas ter  perdido o timer do Universo, e não haver chegado em tempo de oferecer meu colo compassivo de mulher como anestésico.
A estação foi nosso ponto de desencontro: enquanto você partia, eu estava chegando.
Não sei se a minha inútil e extemporânea  compaixão  pode  ter algum efeito para além da temporalidade.
De qualquer forma, diante do mistério, ponho-me em sagrado silêncio e por mais que todas as circunstâncias sejam uma ode ao desespero, insisto teimosamente na superação.
Luto com  Titãs implacáveis dentro e fora de mim.
Somos membros da mesma confraria...
Espero, amigo, ter melhor sorte que você e poder reencontrá-lo para conversarmos longamente sobre tudo o que o tempo nos negou.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

AMPUTAÇÃO




À memória de MARIA ELISA PIMENTA






Cada amigo que atravessa a névoa do TEMPO, leva consigo um pedaço da gente...









e infelizmente já faltam muitos pedaços em mim...






Alma também fica em carne viva...






E dói uma dor latejada e sem esperança...






Uma dor sem cura...






Sem remédio...






que nem as lendas urbanas podem servir de consolo...






Amigo devia ser proibido de morrer...



sexta-feira, 4 de junho de 2010

ANANDA - ÊXTASE, ALEGRIA

Despertei estranhamente feliz – esse sentimento que nos visita de quando em quando de surpresa.

Silêncio absoluto na casa.

Silêncio na praça.

Silêncio na urbe.

Silêncio no mundo.

E como a gente sempre desconfia quando tudo parece perfeito, por um átimo de segundo suspeitei de tanta paz: que estará acontecendo?

Apurei o ouvido em busca de ruídos dissimulados. Mas nada: havia de fato no ar uma tranqüilidade quase tangível, que parecia ironizar minha desconfiança.

Notei que o proprietário da casa, que eu havia alugado para as férias, havia esquecido o dicionário de sânscrito aberto sobre a mesa de trabalho, na noite anterior à minha chegada.

Era um homem excêntrico, professor de filosofia oriental e estudioso de línguas antigas. Como estava precisando de dinheiro, alugou a casa onde morava e se instalou na edícula ao lado, pelo período do contrato.

O dicionário fora esquecido como estava: aberto na letra A, com sublinhas na palavra ANANDA, que despertou minha curiosidade.

ANANDA - sentimento de êxtase, alegria – era a definição do dicionário.

Pensei que, se algum dia tivesse uma filha, seria esse o nome dela.

Abri a janela: uma montanha verdejante me saudou e um raiozinho de sol venho brincar na minha cara.

Como se fosse um mensageiro, um beija-flor parou na minha frente e me ofereceu suas boas-vindas.

Afastou-se, deixando-me de presente a toada de um mistério: essa música silenciosa que permeia a contingência e remete ao sentido de tudo...

sábado, 6 de março de 2010

GEOMETRIAS NÃO- EUCLIDIANAS

Silêncio de cavernas espectrais, solidão...

água pingando, eco...

silêncio rápido...

angústia gritando no peito.

uma vela assusta a sombra,

e me revela o avesso de mim:

sou um segmento de reta

em busca não-euclidiana de sua paralela

no infinito

domingo, 27 de setembro de 2009

RESENHA: INSTINTO -ANTONY HOPKINS EM MAGISTRAL 'INCORPORAÇÃO'

Em mais uma interpretação magnífica de ANTONY HOPKINS, o filme INSTINTO é para ser degustado e revisitado em várias sessões.

Basicamente, o tema tratado diz respeito àquilo que o homem perde quando a razão se torna sua única linguagem com o mundo.

HOPKINS interpreta um antropólogo que se embrenha nas florestas africanas para estudar os gorilas. Aos poucos, no entanto, vai se despojando de sua atitude científica diante do objeto estudado, para se deixar permear pelos elos de solidariedade com os animais e o ambiente: elos que existiram no passado atávico da espécie humana e que se perderam com a chamada “civilização”.

O antropólogo, após se dar conta disso, passa pela traumática experiência da violência do homem contra os animais... a quem tenta defender e, por sua vez, por quem é igualmente defendido.

Ser tão profundamente recebido no seio de outra espécie transforma o antropólogo em alguém que acaba por perder os laços com a sua própria espécie, razão pela qual ele emudece: a negação da linguagem é a marca mais evidente da ruptura com o outro civilizado.

O resgate transformador da linguagem negada se dá com um jovem psiquiatra – não por acaso, negro – brilhante, ambicioso, cheio de valores civilizados, que, por sua vez, resgata em si também a pura e simples capacidade de se identificar com o outro e de se descobrir também um doente da civilização.

Um filme inesquecível, para ser aplaudido de pé.

REALIDADE VIRTUAL

Vivo no avesso de mim.
Apenas minha turbulência dá notícia de que estou viva.
Tanto eu quis aprender a serenidade!
Mas a vida já se faz tarde, e ainda há tanto por fazer...

Revisito com freqüência meu passado,
E minhas cicatrizes sangram como feridas em seu estado original.
Nas minhas memórias ainda te dou vida:
Brinco de deus,
e conduzo a matriz da tua realidade
por desdobramentos diferentes do que foram...

Tenho saudades do que não vivemos...

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

O MOVIMENTO DIALÉTICO E OS NÁUFRAGOS DO DESESPERO

MOVIMENTO I – O DESESPERO DAS QUESTÕES INDECIDÍVEIS – AS APORIAS:


Quem falou de liberdade?
Alguém falou em liberdade?
O que é liberdade?


Seria sentir-se para além da opressão?
Seria desobrigar-se do mundo?
Seria estar livre da contingência?


Quando eu diria: “estou livre”?
Quando, liberta de um peso, um suspiro de alívio perpassasse a minha alma?

Quando,em um instante de introspecção, um suspiro de paz se fizesse presente?

Quando vejo minha gata dormindo, tenho a sensação de que ela é livre...
E que em seu sono, pode habitar qualquer mundo e ainda assim, estar sempre em paz...


Há liberdade na morte?
Há paz na morte?
Haverá uma relação entre liberdade e paz?

Pode haver um mundo regido por leis necessárias e simultaneamente, pode haver liberdade nesse mundo?

Ah, meu Deus!

Por que não bato com a cabeça na parede
E acabo de uma vez com isso?


MOVIMENTO II – A ORAÇÃO DO NÁUFRAGO:

Não me abandone.

Estenda sua mão para que eu não desista.

Não quero que meu fim seja assim: no desamparo absoluto das questões mais importantes.

Seja lá quem você for, preciso de sua mão diáfana, para não estar –logo mais – soterrada sob o mais absoluto desespero...


MOVIMENTO III – AS TENTATIVAS DE RESGATE:


TESE 1:

Houve uma escolha antes do Tempo. Você contemplou as verdades eternas e escolheu um destino a cumprir que se submeterá, no plano da contingência, a leis necessárias.

Objeção: silêncio.

TESE 2:

Você recupera sua liberdade na medida em que conhece as razões. Ao se libertar da servidão em relação à exterioridade, você interioriza as causas de seu existir e passa a desejar aquilo que não se submete à contingência. A sua mente em união com a Natureza Naturante abre o caminho para o retorno ao seio do incondicionado.

Objeção: silêncio

TESE 3:

Seja qual for o desdobramento que a História imponha à humanidade, todas as etapas servem à manifestação do Espírito Objetivo ou do Absoluto no mundo. O Espírito se manifesta na própria História.

Objeção: silêncio.


SÍNTESE DIALÉTICA:

Ao nos submetermos às leis necessárias no mundo da contingência, estamos paradoxalmente retornando ao incondicionado.

Reconhecer que somos parte de um projeto que nos transcende enquanto indivíduos, confere sentido à orquestra.

Enquanto seres que transitam entre as mutações da contingência, somos seres que cumprem um papel na cena cósmica - não sujeita a qualquer determinação.