domingo, 29 de julho de 2007

MARCELO GLEISER

"O efeito Doppler me fez recordar as raras ocasiões em que ouvi meu pai tocar acordeão, um velho Scandalli que fazia parte da família havia muito tempo. Sentado na beira de sua cama, ele começava a tocar, seu corpo e mente entrelaçados com o instrumento, a música jorrando do fole vermelho, numa dança rítmica de expansão e contração. Em expansão, os tons tornavam-se mais graves; em contração, os tons tornavam-se mais agudos. Seus dedos voavam sobre o teclado, criando uma música ao mesmo tempo nova e velha, melodias cheias de mágica. A expansão e contração do fole revelavam, ainda que por apenas alguns instantes, os segredos do Universo, a dança de Shiva e a harmonia das esferas, o que pode e o que não pode ser conhecido, o brilho nos olhos de meu pai. Existem tantas maneiras de compreender o mundo ..."
( A dança do Universo, Companhia das Letras, pag. 330/331)

sábado, 28 de julho de 2007

REFLEXÕES DE UMA CÂMERA DE SEGURANÇA

Cá estou em permanente vigília, um olho que jamais dorme em nome da prova ad perpetuam rei memoriam!

Eu sou o olho de uma câmera de segurança e acho que a mim caberá, um dia, uma tarefa mais importante do que simplesmente registrar eventuais condutas ilícitas dessa espécie complicada que é a tal de espécie humana.

Vejamos: eu sou o narrador em terceira pessoa, por excelência. Minha perspectiva é isenta. Registro os fatos como eles são, não faço interpretações. Posso ser de boa utilidade para historiadores, sociólogos, filósofos...

Mas outro dia, meu olho capturou uma cena que me fez pensar – se é que posso me valer dessa palavra...

Av. Paulista, quase meio-dia.

A vida seguia o seu fluxo sem muita novidade.

De repente, foquei um morador de rua – já velho conhecido.

Deve ser um pouco desequilibrado, costuma falar sozinho. Mas – muito embora, eu não seja dotado do sentido da audição - minha impressão é de que, na verdade, não fala, murmura: seu diálogo é intimista.

Essa pessoa, que perambula pelas ruas de São Paulo, sem ter o que comer e sem ter onde recostar a cabeça... alimentava os pombos com miolo de pão...

A vida seguia o seu fluxo sem muita novidade...

E me perguntei, afinal, quem de fato ali estava à margem da vida : os que cumpriam suas tarefas, em pressa delirante, alheios à cena, ou o louco que alimentava os pombos, apesar de não ter o que comer?

sábado, 21 de julho de 2007

MARCOS LARA REZENDE


"Meus amigos são todos assim: metade loucura, outra metade santidade.
Escolho-os não pela pele, mas pela pupila,que tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
Escolho meus amigos pela cara lavada e pela alma exposta.Não quero só o ombro ou o colo,quero também sua maior alegria.Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem,mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos, nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice.Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto,e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou,pois vendo-os loucos e santos,bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a normalidade é uma ilusão..."

sexta-feira, 20 de julho de 2007

NIETZSCHE

"EU VOS DIGO: É PRECISO TER AINDA CAOS DENTRO DE SI, PARA PODER DAR À LUZ UMA ESTRELA DANÇANTE" -
ASSIM FALOU ZARATUSTRA, 7A.EDIÇÃO, EDITORA BERTRAND BRASIL, PAG. 34